21.8.06

Ilha 102
"Por favor não retirem o grampeado grande da sala de xerox."

Com vocês, diretamente de entre as pernas de Ágata, Joel.

“Parece uma orquídea. É uma orquídea? Não! É uma boceta! Mas que parece uma orquídea, parece.”

Era a terceira ou quarta vez que transavam naquele dia. Ágata contava quatro, Joel contava três - para ele o boquete que Ágata tão habilmente realizara de manhã não se categorizava como coito, mas Ágata contava gozo como coito, pelo menos o dele. Se fosse contar pelo dela diria que tinham transado duas vezes naquele dia. Nem ela nem Joel estavam particularmente inspirados; toda a inspiração havia sido gasta nos dois primeiros dias.

Agora se deitavam plácidos, fedendo a sexo em um quarto fedendo a sexo. Joel sentia as costas doloridas, Ágata mal conseguia andar. Era a pressão que era chata, a pressão era muito chata, encarar tudo aquilo como uma janela de oportunidade, o que de fato era, se tornara extremamente cansativo. Quando se tem que aproveitar algo, acaba-se não se aproveitando coisa alguma. Era tudo como a obrigação de se embriagar no Reveillon, e ambos já estavam de ressaca.

Ágata queria conversar, Joel sabia, mas Joel não queria conversar, tinha medo, morria de medo da hora em que descobrissem que de fato não tinham nada a dizer – sim, tinham o que dizer, por mais ou menos uma meia hora teriam assunto – falariam sobre o escritório, falariam mal dos colegas, do chefe. Depois que esse assunto morresse surgiriam as pautas de elevador, os tópicos da conversação agonizante: “viu a entrevista de não-sei-quem no jornal?” “Que tempinho de merda, hein?” “Quanto será que ele ganha por ano?”. E depois o silêncio. Aquele silêncio de agora não incomodava, aquele era o silêncio de gente não falando, não era o silêncio de gente sem mais nada a dizer.

Mas Ágata queria conversar.

“O Wagner vai chegar amanhã de tarde, a gente precisa sair cedo.”

“É, eu sei.”

“Que horas ela chega?”

“Ela só volta amanhã.”

“Onde é que mora a mãe dela?”

“Juiz de Fora.”

“Ela é de lá?”

“A mãe dela?”

“Não, a Carla.”

“Não, ela é carioca.”

“Ah...”

“Vou tomar um banho.”

“Tá”.

Joel não queria tomar banho, não naquele momento, mas precisava sair dali, pois logo chegaria o silêncio. Além do mais não gostava de ficar falando da mulher, nem gostava quando ela falava no marido.

No chuveiro ele se interrogava. Por que se incomodava tanto em ouvir do marido dela? Pensava, esfregando o peito, pensava. “Deve ser muito ruim ser corno, eu não quero ficar ouvindo falar do Wagner por que ele é corno. Faz eu ficar pensando – será que eu sou corno também? Mas claro que não sou corno, a Carla foi pra casa da mãe dela, levou o menino, como é que eu vou ser corneado em Juiz de Fora? Viu, é isso, fica botando idéia na minha cabeça essa conversa. Essa mulher tá começando a me irritar.”

A idéia parecia boa, mas quando ele chegou lá percebeu que não era idéia, não foi pensado, não tinha estratagema. O Wagner viajava, a Carla viajava, o que eles iam fazer? Depois de tanta arquitetura, tanto trambique por míseros quarenta minutos por semana, era óbvio que eles tinham que “aproveitar” essa coincidência bissexta, bizarra, esse afastamento imprevisível de ambos os cônjuges durante o feriado. Como não? Com que alegria eles haviam planejado, com que dedicação ele procurara o melhor hotel que o seu adiantamento podia pagar. Como ela tentava-o durante a semana anterior ao feriado, se esfregando nele por debaixo da mesa de reuniões, o pé dela procurando a barra da calça dele e se enfiando sob ela como um peixe escorregadio em uma toca subterrânea, a meia de nylon macia contra os pelos da perna dele, o email erótico disfarçado de memorando.

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Assunto: Por favor não retirem o grampeador grande da sala de xerox.”

De: Ágata Costa (recepção)
Para: Joel Andrato (tesouraria)

Eu vou t lamber todo daquele jeito que vc gosta. Quero sentir vc dentro de mim, vamos ter mt tempo eu vou te fazer coisas mt doidas c/ vc. Guarda tudo tudinho p/ mim que eu vou t fazer gozar como vc nunca gozou. Eu fico molhadinha so de pensar vou te dar mt prazer. Vai ser muito bom vc jah viu quanto custa a diaria?

Ass: Gostosa da recepção.

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Assunto: Re: : Por favor não retirem o grampeador grande da sala de xerox.”

De: Joel Andrato (tesouraria)
Para: Ágata Costa (recepção)

Gostosa,

Quero vc bem molhadinha mesmo pra quando eu enfiar a minha pica dentro de vc te fazer gritar muito que nem na semana passada. Vou te comer em todas as posições que existem e vou te fazer gozar muito vc vai ficar sem conseguir andar por uma semana. eu fico de pau duro so de pensar em vc e arrancar as suas roupas e enfiar c/ tudo nessa tua bucetinha gostosa. Vou te chupar ate vc gritar de prazer, vc vai ver.por favor nao depila as pernas pq eu quero te raspar. Jah vi a diaria custa 60 reias com cafe da manha. Vai ser muito bom, vc e muito boa.

Ass: bem dotado da tesouraria

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Joel uma vez tinha raspado as pernas de Carla e aquilo o excitava terrivelmente. Mas com Ágata foi diferente – não pode deixar de sentir um certo nojo. Os pelos dela eram diferentes, eram grossos, espetados como uma barba cerrada. Além do mais, o contexto era outro; ela se insinuava enquanto ele manejava a gilete, perguntava se ele estava gostando. Com a Carla tudo tinha sido inocente, ele só estava raspando as pernas dela e qualquer implicação erótica que isso pudesse ter existia somente na cabeça dele. Mas com Ágata não, ela encarava aquilo como preliminar. Não tinha graça.

Apesar disso o primeiro dia foi maravilhoso, com aquela camisola que ela vestiu – nunca tinha visto ela vestida daquele jeito, os propósitos tão transparentes quanto a falsa seda negra. As roupas que ele costumava arrancar dela eram ásperas, pesadas, eram tantas. O blazer de poliéster, a saia com o zíper que agarrava na blusa, a blusa tão cheia de botões, o sutiã de ganchos teimosos.

No segundo dia rasgou a camisola dela – ela julgou que o ato havia sido movido por paixão animalesca pungente, mas na verdade a camisola o irritava. Não entendia aquilo, - pra quer vestir tão pouco se ela logo estaria nua de qualquer forma? Não caia bem nela, era vulgar, barato.

Joel espremia um cravo, nu frente ao espelho retangular. Pensou em fazer a barba. Teria aparado as unhas do pé se tivesse um alicate, qualquer coisa para retardar seu eventual retorno à companhia de Ágata. Uma vaga sensação de tédio embaçou seus olhos, mas ele a descartou; não era tédio, era uma leve frustração, um desapego, uma solidão enfadonha. Saiu do banheiro, não adiantava ficar ali, ela logo o chamaria. Ia querer saber porque ele demorou tanto, mulheres sempre querem saber essas coisas.

Ágata estava sentada na beira da cama. Havia posto a camiseta dele, lhe parecia muito bonita naquela situação tão despretensiosa. Ela se jogou para trás, as pernas balançando, dependuradas da cama, não tocavam o chão. Ágata levou um dos braços sobre a testa, encarando o teto.

“E se fosse sempre assim?”

“Como assim?”

“E se a gente desistisse de tudo, hein? E se fosse sempre assim, nós dois?”

“Não viaja, Ágata, não viaja.”

Joel começou a catar suas coisas pelo quarto com uma pressa desmedida. Enquanto vestia as calças pensava em Carla, em seus pelos macios.


Em um apartamento de 2 quarto em Juiz de Fora, a mãe de Carla comentava com a filha sobre as suiças do ator da novela de época.

J.

Um comentário:

Anônimo disse...

a carla, tadinha... gostei muito. bj.