29.5.07
Nos enganamos impunemente,
Fugimos pela estrada nevada:
Derrapa muito, e é muito perigoso.
Vencemos cada curva como se fosse a última.
Chegamos à costa,
Ainda fazia muito frio
E os meus lábios estavam muito feridos.
Não achamos consolo no mar,
Só o vento frio e salgado
Que aumentou o estrago
e enferrujou as fechaduras das portas.
Ficamos presos num quarto,
Por noites a fim ouvimos
os cascos reluzentes de um cavalo.
Novamente fugimos, impunes,
A neve havia derretido.
Chapinhando pela lama
Renovamos nossos votos
E fizemos promessas sinceras.
Mais nenhuma palavra foi dita.
28.5.07
O povo que não recebeu o memorando.
Existem algumas pessoas em certos cargos ou profissões que, aparentemente, faltaram no primeiro dia de trabalho, ou não receberam o memorando que apresentava a elas os deveres e a idéia geral por trás do que elas estão fazendo. Essas pessoas não são necessariamente maus empregados, eles simplesmente não entenderam.
Porteiros – o cara do prédio da minha mãe acaba comigo. Ele está lá há alguns meses, e ainda não entendeu. Na verdade, eu suspeito que ele tenha escolhido a carreira errada. O sujeito fica lá, sentado entre o portão e a porta. Ele arrastou uma cadeira para segurar a porta inclusive, que é pra ele não ter que abrir ela e se focar inteiramente no portão. Sem problemas, eu não sou uma pessoa que escolhe a estética contra a praticidade. Eu não sei o que está acontecendo com aquele cara: vai ver ele e está fazendo algum treinamento telepático, está tentando aprender a abrir o portão com o poder do pensamento. O fato é que ele nunca, jamais, se levanta para abri-lo. E esse não é um desses portões eletrônicos, controle remoto. Alguém realmente precisa enfiar uma chave, girar e puxar. Ele não se comove com o fato de você estar carregando três sacos de supermercado, ou uma bicicleta. O homem está lá, tal qual uma montanha, irremovível, encarando o portão. Eu acho que ele nasceu pra ser recepcionista de elevador. Está na cara. Ele tentou a coisa mais perto que tinha, porteiro, mas tem essa inconveniência de ter que se levantar. Mas nada disso vai impedir que ele viva o seu sonho de ser recepcionista. A fé pode até mover montanhas, mas não move aquele homem.
Seguranças – O sujeito contrata o segurança. Diz pra ele “O negócio é o seguinte, Átila, você tem que manter tudo por aqui em paz, não deixar ninguém incomodar ninguém, evitar que as pessoas se batam.”. É isso aí. E eu imagino que, em um dia particularmente pacífico, o trabalho de Átila seja meio frustrante. Afinal de contas, se a paz reina sem a sua interferência, ele realmente não está fazendo o trabalho dele. Então o que ele faz? Ele cria uma situação em que os seus dotes físicos sejam necessários. Ele compra uma briga. O que Átila não entendeu foi o conceito de só fazer alguma coisa quando alguma coisa for necessária. Ele não entendeu que se está tudo bem, ele realmente não deve fazer nada, apenas estar preparado para alguma eventualidade mais violenta – que essa também é uma forma de estar cumprindo com as suas obrigações. Ele é o oposto do porteiro da casa da minha mãe – ele não é um empregado ruim, ele dedicado demais.
Taxistas:
Ele: O CAP? Claro, claro.
Eu: Ótimo, eu vou para um prédio do lado do CAP.
Ele: Tem uma Igreja ali perto, né?
Eu: É, tem sim.
(Começamos a rodar – eu estou ouvindo o meu Ipod e não estou prestando muita atenção. O carro para. Eu olho pra fora e vejo o prédio da Obra do Berço.)
(Eu olho pra fora com um olhar de que porra é essa. Eu olho o prédio da Obra do Berço, eu penso nas iniciais. ODB. Eu queria ir pro CAP. Eu repasso a conversa que eu tive com o meu amigo ali. Sim, eu tenho certeza que eu pedi pra ir pro CAP.)
Eu: Chefe, isso daqui não é o CAP. É a Obra do Berço.
(saio, bato a porta).
21.5.07
Wishlist
- Garrafa de Jack Daniels
- Câmera Digital
- Tinta Acrílica (cores primárias)
- Livros (poesia, clássicos)
- Kit Casa Cruz – (Canetas coloridas, carvão, diversas variedades de lápis, borracha, apontador, papéis)
- Calcinhas (que não entrem na bunda, mas sem ser de velha)
- Uma passagem para um vôo internacional
- Poemas, canções, cartas de no mínimo duas páginas.
- A presença dos que eu amo, a presença dos que me amam.
20.5.07
"There's some sweetness to it, you'll see. You may get a better glimpse of my eyes and my breasts as I lay my cards on the table. "
eu não quero mais esconder nada de você - dá muito trabalho, um labouro solitário que ocupa horas em que eu deveria estar dormindo. E não há felicidade aqui, existe a alegria sublime da aceitação dos fatos. E os fatos são confusos e antagônicos, mas eu os aceito. Tomara que eles me aceitem também. Aceite também, se mais cedo ou mais tarde (você diz) você vai aceitar, que não seja mais tarde.
17.5.07
Vamos desligar os
aparelhos dos ou-
tros doentes e, en-
quanto a morte se
ocupa deles, nós
poderemos fugir.
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Nossos olhos são mais apurados,
eles te enxergarão. Nossas arma-
dilhas são mais certeiras - elas te
prenderão. Nossos cães são mais
ferozes - eles te alcançarão. Nos-
sas facas são mais afiadas - elas
te cortarão. Nossas leis são mais
severas - elas te julgarão. Nossa
justiça é mais cega - ela te casti-
gará. Nós estamos muito longe
de Deus, amiguinho. ELE NÃO
TE SALVARÁ. Em resumo,
filhote, você, ESTÁ BEM FODIDO.
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Truth loves Him,
it doesn't love you.
Beauty chose Him,
It scorned you.
This is His law,
This is His realm.
There ain't no
suggestion box.
So you might as
well get used to it,
babe.
Get used to it.
------------------
Você não morreu
pela beleza, você
se matou por
uma miragem.
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Aqui vivem os suicidas que não conseguiram
morrer, por aqui estão as crianças desapare-
cidas, aqui moram todos os animais de sangue
quente que querem se vingar de Deus. A flor
talvez não te pegue, mas alguma coisa irá. Os
elefantes brancos e os amantes de coração
partido vêm aqui para morrer.
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Eu já fui essa que vos fala
mas ela se descartou em
algum beco, ela era má e
cismou em amar o homem
errado, ela chora ouvindo
Roberto Carlos, ela é uma
manteiga derretida que
chora assistindo anúncio
de margarina.
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As you can see
This is a beautiful place.
But it's what
you can't see
that will bring
death to you.
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Esse é o lugar das coisas
que podem te matar.
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11.5.07
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Esse é o inferno
Das mulheres que
Amam o homem
errado, que foram
abandonadas no
leito frio a manhã,
que choraram até
a hora do café e que
nem por isso,
deixaram de amar.
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Esse é o inferno de uma mulher
Que permanecerá desconhecida
Seu corpo nunca foi encontrado.
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Esse é o inferno de
José de Calazans Fer-
nandes, que em uma
cidade citiada por
Lampião, viu a sua
filha morrer.
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Esse é o inferno dos homens que
Só tarde demais, perceberam ter
sido elegidos pelo amor. Amargu-
rados, eles penduraram seus es-
cudos e depuseram suas armas e
resignaram seus tronos de gue-
rreiros e pagaram o dote da solidão.
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Esse é o inferno da mulher que
ficou amarga, a vizinha mal a-
mada que enloquece dia a dia
com uma goteira que só ela po-
de ouvir, e morre de um câncer
Diagnosticado por ela mesma,
cheirando éter, injetando mor-
fina, alucinando que as cortinas
estão em chamas, fumando um
cigarro atrás do outro numa bo-
lha refrigerada, numa sala cheia
de gatos empalhados, sem jamais
ouvir à campainha que toca, toca.
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Esse é o meu inferno, ele
tem o nome de um homem.
Eu vim de uma paraíso que
tinha o mesmo nome.
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Esse é o
Inferno
De uma
Mulher
Comprou
Enxoval
Perdeu
O bebê.
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Esse é o inferno de M., que treme enquanto assite o soro pingar
lentamente - ele pede que eu diminua o ar-condicionado. Reflu-
xo no soro - o tubo se enche de vermelho. Eu imploro para que
ele pare quieto. Ele me olha profundamente, os olhos cercados
por círculos marrons arroxeados: "Eu sinto muito frio." Mas não
é só frio que M. sente - é náusea constante, cólicas e enxaquecas
épicas. Ele geme, M. geme: "Eu estou morrendo de frio". Mas não
é de frio que M. morre, ele está cansado de saber que é de câncer.
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Esse é o inferno
De R. - esse infer-
fede a porra e su-
or de homens ve-
lhos e gordos, que
tem sempre sob as
unhas uma sujeira
sob a forma de uma
nojenta pasta negra.
Alguns deles choram
depois de comer R, e R
se sente na obrigação
de consolar. Não por
que ele ache que o
dinheiro vindo daque-
las mãos sujas valha a
sua compreensão - R
consola simplesmente
porque tem um bom co-
ração que entende
o que é ser triste.
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7.5.07
se vocês se derem ao trabalho de descer até o fim dessa página, verão um intrigante retângulo branco. Pois é, eu descobri um jeito de por um Mp3 player aqui. Ali vocês encontrarão todas as músicas do meu disco (na pasta Flor Indócil) e playlists contendo músicas sobre as quais eu escrevi em Suffle 3 & Shuffle 4. Bacana pacas, né? Super transadinho!
By the by, se ninguém fizer qualquer comentário em qualquer joça nas próximas 72 horas eu não mais irei me referenciar a vocês como "Caros Leitores", e sim como "Bando de Mocorongos". Estejam avisados.
toda cagada de tinta acrílica,
J.
5.5.07
5/5/2001
Pontiac Stage
May 5, 2001
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Eu estava me apaixonando por um homem, vendo outro que fez eu me apaixonar pela música e conhecendo pessoas que mudaram a minha vida para sempre de forma definitiva. Eu me derramo em prosa e verso aqui, mas disso eu não vou falar: talvez por que é pessoal demais, ou talvez, por ser pessoal demais, eu acho que nem vale a pena tentar explicar. Mas no dia 5 de maio de 2001 eu fui mais feliz que em qualquer outro tempo ou lugar.
"I married Isis on the 5th day of may..."
4.5.07
Faço aula no Parque Lage (Pintura I) há muitos anos. A minha turma é, sem sombra de dúvidas, a mais anárquica e divertida de toda a Escola de Artes Visuais. E muitas coisas hilárias e maravilhosas são ditas. Essas são só algumas da última aula:
"A pintura não morreu, mas a gente tá passando um pouco mal." - J.M, pintor e professor, em uma discussão seríssima sobre a morte da pintura.
"Vocês tem um professor megalomaníaco e outro egocêntrico. Cês tão fodidos." - W.G, ou outro professor.
"O que que é autorama?" - J.M que, aparentemente, não teve infância.
"Ah, meu filho, cê tá cutucando urso com palito." - Eu, alertando J.M
"Aqui J., fala do seu trabalho." - W.G, botando um rolo de fita adesiva em frente à J.M
"Não falo! Não falo!" - J.M, se recusando a decorrer sobre o rolo de fita adesiva.