9.8.07

Na Eminência (título provisório)


Aqui, na presença de olhos pardos, aqui, na eminência de olhos azuis, enfim, na incerteza de olhos que mudam de cor. Ele abrigava, sob os cílios, um segredo inconfessável. Piscava e se desfazia do último reflexo que os olhos contiveram. Pra onde foi? Ele não diz, é segredo de estado de espírito. Os olhos ruminam, regurgitam o que ele já viu; estão fechados.

Em Copacabana faz um frio estrangeiro. No ônibus, no metrô, nos espaços fechados, sentimos o cheiro de mofo e naftalina exalados pelos agasalhos inutilizados há tanto tempo. Todos têm cheiro de gaveta de avó, todos parecem que acabaram de desembarcar de São Paulo. O hálito de mentol do inverno nos transformou em estranhos bem vestidos. O porteiro me confessa que está usando polainas. Eu acho que é um certo exagero, mas considero a possibilidade de estar subestimando o frio que eu sinto. Em casa visto polainas. Faz sentido, já tinha esquecido como era não sentir frio.

Uma vez eu queimei muito a pele, uma vez eu fiquei muito doente com intoxicação alimentar. Eu não lembrava como era ser tocada sem sentir dor, eu não lembrava o que era sentir fome. Quando eu morrer, quando eu não respirar, eu não vou lembrar da falta de ar que eu sentia quando viva.

C. e X. moram em um país estrangeiro onde a moeda é mesma, mas não vale a mesma coisa; onde falam a mesma língua, mas usam as mesmas palavras. Lá não tem mar, tem um monte de coisas. Mas não tem mar.

Um comentário:

Raul Mourão disse...

bom. muito bom. estou saindo p o servico. volto depois p ler com calma seus textos. bj