20.10.07

Hoje, em um bar no Jardim Botânico, eu falei para um amigo estrangeiro sobre as belezas de Manuel Bandeira. Em um afã eu recitei um poema do Bandeira, o único poema que eu sei de cor, "Desencanto":

Eu faço versos como quem chora
De desalento... de desencanto...
Fecha meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardente...
Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústia rouca
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.

– Eu faço versos como quem morre.

(Manuel Bandeira – A Cinza das Horas – Teresópolis, 1912)

Eu li esse poema pela primeira vez quando eu tinha 12 anos - li no Estrela da Vida Inteira, um livro de capa púrpura que me acompanhou pelo resto da vida. Li, reli e decorei, sem querer, querendo.

Hoje, chegando em casa depois do bar, senti a nostalgia de ler Bandeira. E li Bandeira, e resolvi ler sobre o Bandeira. Não li nada que eu não soubesse, apenas uma coisa - a data de sua morte. Ele morreu 18 de Outubro, ontem. Fiquei meio pasmada, porque é a data do aniversário da minha irmã, e senti novamente o afã que me invadiu na mesa de bar e que me fez ler e reler esse poema.

Quando eu li o poema, aos doze anos de idade, eu começei a escrever. Talvez tenha sido no dia seguinte, talvez nas horas seguintes, talvez uma semana depois. Mas ali eu começei a escrever.

J.

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